Real, Mourinho, Schmidt e Conceição
Mais que sublinhar o evidente, que o Real Madrid é o rei da Champions, vale a pena buscar a razão mais profunda deste domínio, até porque – valerá a pena lembrar aos mais novos – não foi sempre assim. O último grande dominador da Europa foi também o primeiro, mas viveu um hiato de… 32 anos (!) sem ganhar uma Taça ou Liga dos Campeões, de 1966 a 1998. O que aconteceu, entretanto? Aconteceram jogadores. Primeiro de topo, como Roberto Carlos, Redondo, Suker Mijatovic, depois galácticos de verdade, de Figo a Vini Jr, numa galeria que inclui Zidane, Ronaldo fenómeno, Bale, Cristiano Ronaldo, Benzema, Modric, Kroos. Em provas a eliminar, ter os melhores jogadores é ainda mais decisivo, porque em dias de motivação absoluta são imparáveis e na hora certa raramente falham. A cultura de vitória é filha desta qualidade. E por isso não há outra igual na Europa.
Para ter sucesso no Fenerbahçe, José Mourinho tem de perceber que não foi bem nas últimas épocas. Ele próprio não foi bem e as suas equipas nunca entusiasmaram, ao contrário do que sempre aconteceu na primeira década da carreira. Percebo que valorizar as finais que alcançou com a Roma seja uma forma de desmentir o declínio, mas será bom que o próprio não acredite nisso. O que fez no FC Porto, no Chelsea, no Inter e mesmo no Real esteve muito acima. Já sem ele, a Roma esteve recentemente à porta de mais uma final, e a Fiorentina, por exemplo, também vai em duas decisões consecutivas na Europa. Istambul pode marcar o relançamento da carreira de um técnico lendário, mas depende muito do que ele próprio for capaz de mudar.
Rui Costa explicou a repetição da aposta em Roger Schmidt com uma ideia que pode parecer absolutamente racional, mas que aparenta solidez discutível. O presidente encarnado acredita que não foi por acaso que a primeira época correu bem. Já descontando o facto de essa primeira época não ter sido propriamente uniforme – claramente de melhor a pior – a questão é: então a segunda época, em que correu quase tudo mal, foi por acaso? Ou seja, quando chegou e aproveitou a matéria-prima disponível, o sucesso não foi por acaso, quando teve mais influência nas opções e contratações, já foi. Parece uma questão de fé, ou pelo menos de grande otimismo. Não costumam ser os caminhos mais seguros numa decisão crítica.
Apesar de todas as debilidades demonstradas, a verdade é que Schmidt conseguiu, nas duas épocas em Portugal, ficar à frente de Sérgio Conceição, o que não deixa de ser assinalável, e até curioso, dada a quase unanimidade em redor do futuro ex-técnico portista. Que, a propósito, ganhou apenas um dos últimos quatro campeonatos que disputou. As taças também contam, naturalmente, e Conceição tem méritos indiscutíveis, como os da competência estratégica que muitas vezes aqui sublinhei. Acredito, contudo, que seria tanto (ainda) melhor treinador quanto mais reduzisse a sua instabilidade emocional.
A verdade é que nem os seus mais próximos, nem o próprio clube, ajudaram a atenuar tal caraterística. E no meio do turbilhão de excessos que tantas vezes incluiu ou rodeou Conceição, Vítor Bruno surgiu recorrentemente como um contraste de racionalidade. Também por isso o ex-adjunto será visto hoje como o homem que pode ajudar a construir um novo Porto.
PS: O Portimonense desceu de divisão e o Estrela da Amadora sofreu até ao fim. Mandar às malvas um jogo mais elaborado e apostar num futebol musculado, feito de duelos e correrias, não funcionou. Os erros individuais, de que ambos os técnicos – Paulo Sérgio e Sérgio Vieira – se foram lamentando, ocorrem mais vezes quando as qualidades técnica e de tomada de decisão são desvalorizadas.